domingo, 21 de fevereiro de 2010

Samambaia (Corpos num íntimo circular – Final)

Entende minha fadiga? Você compreende meu cansaço? O cigarro acabou e só tenho entre os dedos os palitos de fósforo. Na vitrola Samambaia. Maracutaia a sua dizer que eu não te liguei. Agora não há mais tempo e não me importa os teus questionamentos bobos – o espetáculo acabou. E é só.
Eu não sei como se formam os casais, tampouco se eles são reais ou fantasias de um universo abstrato, corpos num íntimo circular dentro de espaços apertados ou chãos umedecidos de suor, eu nãos. E mesmo que eu soubesse, não conseguiria descrevê-los para você agora. O cigarro realmente acabou e minhas pontas dos dedos queimadas evidenciam que a noite foi longa e sem luar, e sem estrelas, e sem vento. Dedos queimados, ausência de fumaça e luz. Uma desagradável vigília poética, como um corpo exprimido entre as estrofes perfeitas de um soneto.
Não importa os olhos úmidos – na verdade remelentos. Não importa o cheiro que vem da tua boca carnuda – na verdade um mau hálito eterno. Não importa o perfume e o calor do teu suor – na verdade um odor insuportável de sujeira. Eu vou só àquele lugar.
Sente-se comigo aqui, só um pouco. Abrirei mais uma garrafa de vinho escocês e brindaremos em copos de massa de tomate. Apreciaremos o que há de melhor na boa gastronomia suburbana: pedaços de moela ensopada e ovo rosa expostos na estufa de vidro. Peça um galeto ressecado, não tema, eu pago. Conclua sua frase, vamos, tome um gole de Dreher e verá que a vida será mais macia. Vamos, aprecie esse charuto.
Estou tonto. Dois Harvard acabaram comigo... A Avenida Atlântica, a Vieira Souto... Estou na Primeiro de Março. Estou na Sacadura Cabral. Rodo, perco, o rumo. Estou com as calças molhadas. Estou sem me ver... Acho que isso e fim.


Parte I do conto: http://oventriloquo.blogspot.com/2010/02/corpos-num-intimo-circular-parte-1.html

Parte II do conto: http://oventriloquo.blogspot.com/2010/02/por-amar-demais-corpos-num-intimo.html

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