domingo, 27 de setembro de 2009

Domingo, sinais de depressão: Programa Silvio Santos

“Lá, lá, lá, lá. Lá, lá, lá, lá. Lá, lá, lá, lá. Lá, lá, lá, lá... Agora é hora de alegria, vamos sorrir e cantar. Do mundo não se leva a nada, vamos sorrir e cantar. Sílvio Santos vem aí. Olé, olé, ôlá...”.
Hoje é domingo e me vem uma sensação de vazio. Para mim, domingo sempre foi sinal de vazio, ao contrário do tradicional “primeiro dia da semana”, sempre achei que ele tinha mais cara de último do que de primeiro. Dia de dormir cedo, pois tinha escola no dia seguinte. O futebol não se estendia no campinho. Era dia de culto na igreja, Fantástico na TV e claro: Programa Sílvio Santos: “Quem quer dinheiro?”, “Roque!”... A marchinha que citei acima, composta, em 1965, por Archimedes Messina, para esse mesmo Programa Sílvio Santos, só que na Rádio Nacional, era o final dos tempos para mim.
Hoje, domingo, estou só. Algumas coisas, alguns sinais em mim muito me preocupam, creio que estou ficando deprimido. Espero estar errado, mas acho que não estou.
A falta de sono que me corroem os olhos e corpo ou, quando ele vem, as noites mal dormidas, o acordar tarde sem vontade de sair de casa e ver o sol, sentir o vento, as frases curtas, as leituras secas, o cabelo desgrenhado e a música clássica no som, tudo me indica que estou ficando deprimido. O sorriso forçado e a angústia que precede a volta para casa e o meu silêncio, tudo me indica que estou ficando deprimido.
“A lua de mel acabou”, já dizia um amigo, também recém chegado aqui. O momento é delicado, as observações já foram feitas, os primeiros choques, as decepções, os alívios e felicidades, tudo num furacão de emoções e pensamentos. Palavra é pensamento. Discurso, para mim, sempre foi prática. Ficarei aqui, não restam dúvidas ou fatos contrários. Como disse, a primeira impressão – boa – já se foi. Fica agora o olhar atento de alguém que conhece outros lugares, percorreu vários caminhos até chegar aqui e até aqui foram muitas vozes que emiti. No balanço final: ponto para mim. Estou onde deveria estar.
Não vejo TV, minha ligação com o mundo é virtual. Com o Rio de Janeiro é o jornal O Globo que leio on-line, sobre Aracaju, que me perdoem todos, fico sabendo pelos alunos. Não que não me interesse, apenas não tenho tempo: sinal de que estou ficando deprimido. Pois sempre administrei bem meu tempo e sempre tive tempo para tudo. Na verdade, como bem observou minha mãe um dia por telefone, ao me questionar se eu queria comprar um aparelho de televisão, a caixa mágica, desde menino, nunca me chamou muita atenção. A televisão NÃO me deixou burro, muito burro demais! Mas pelo visto, o “sorvete me deixou gripado pelo resto da vida...”.
Não sei por onde anda o Gugu Liberato, se o Roque ainda é vivo, nem qual a nova novela das oito da Globo. Sei, pela internet, em algumas chamadas de matérias, que aquela menina bonita pra burro, Taís Araujo, é a primeira protagonista negra de uma novela das oito da emissora, bom para ela, bom para quem vê. Acho que sim. Ah, sei que ela é mais uma Helena do Manoel Carlos – Paciência.
Não sei se é qualidade ou defeito meu, porém, já fazem, praticamente, seis meses que não sei o que é uma novela. Me lembrei agora da novela infantil do SBT, Carrossel, como eu adorava aquela novela quando criança (eu sei que era um pé no saco, mas, acredito que quem tem hoje a minha idade curtiu pra caramba): “entre duendes e fadas a terra encantada espera por nós, abra o seu coração, na mesma canção, em uma só voz...”. Não sei de quem é a música, tampouco, tenho paciência no momento para pesquisar no Google, mas achei no Youtube a abertura, taí, quem quiser se aventurar e lembrar a infância, que veja depois de ouvir o que ainda tenho para dizer hoje com o sol quase raiando no mar.

Ontem, acordei às 7:30 da manhã, pensei “vou dormir mais um pouco”, meu corpo doía, meus ouvidos também, quando acordei estava envolto ao meu colchonete inflável vazio, com o corpo mais dolorido do que antes. Ao mesmo tempo o telefone tocou, já era 12:20, fui almoçar fora com um amigo do Departamento de Educação Física da UFS (o Kiko) e seu orientando, papo alegre, as horas se passaram, quando vimos já eram 17:00 horas. Voltei para o meu apartamento, tomei uma ducha, fui pesquisar um pouco para o doutorado. O telefone toca, um amigo do Departamento de História (o Augusto) me convidando para jantar. Aceitei. Confessei minha tristeza no caminho de volta para casa. Acabamos num bar, que lembra uma coisa meio carioca, no Shopping Jardins, um chopinho, conversas sobre a infância, já era domingo, meia noite, cedo para um carioca, mais cedo ainda para um angustiado pela solidão.
Uma idéia na cabeça e um celular na mão, este tem sido meu lema, liguei para o Kiko, como diz Ana, meu anjo da guarda aqui: “basquete na orla, está afim?”. Até as três da madrugada batemos bola, fizemos cestas, disputamos partidas, quase vimos o sol nascer. Bom momento – momentos bons acabam.
Mas hoje é domingo. Famílias se reúnem para macarronadas, churrascos, conversas no portão, é dia de futebol às 16:00, Fluminense no Maracanã, tão mal das pernas como eu de sorriso. Porém, eu estaria lá com meu manto tricolor, cantando “A benção João de Deus” ao lado do Thiagão, chope depois na Tijuca. Mas hoje é domingo e não ficar bem no domingo, aqui ou em outro lugar, é algo que, pelo menos, me parece familiar. Já ouço os ônibus voltando a rodar, a vida roda novamente, são 4:33 da manhã – é hora desse daqui se retirar e tentar descansar um pouco. Inté.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Quatro meses longe de casa...

Hoje, dia 24 de setembro de 2009, completa quatro meses que saí do Rio de Janeiro com nove caixas grandes de livros, duas malas, uma mochila e lágrimas nos olhos. Faz quatro meses que vi pela última vez as praias, as ruas e avenidas, o trem, o metrô e Mesquita.
Deixei no Rio de Janeiro, minha família, uma noiva linda, amigos e raízes. Deixei para trás a correria carioca, o morro, o samba, o choro, os botecos e um pouco de poesia. Lá ficaram também problemas de dinheiro, aperto financeiro, sonhos sempre adiados e mais livros. Ficou no Rio de Janeiro um poço de saudade que derrama aqui todos os dias e me lava a alma quando sinto o vento nos cabelos pretos, pretinhos, como diria minha Ana.
Deixei meu pai e minha mãe orgulhosos, mas sem um pedaço de si. Meu quarto não é mais meu e minha casa não é mais minha: é a casa dos meus pais que, agora, quatro meses depois, é lugar de visita para mim. E que logo, logo, chegarei com sorriso aberto. Um mês, dois meses, mais ou menos para eu aparecer por lá.
No Rio de Janeiro, deixei, nessa mesma casa, fotografias que há quatro meses rememoravam apenas meu rosto quando menino, agora, para meus pais e, também, para mim, quando ali pisar, rememorará o tempo em que eu vivia ali e corria de pés descalços pela terra macia e fresca do quintal. Um tempo em que me sentava debaixo das mangueiras, abacateiros, jaqueiras, pensando, sonhando com o futuro: o futuro agora me relembra o passado.
As mesmas ruas em que eu caminhava naturalmente com os cachos ao vento, um sol quente corando o rosto, seja indo ao açougue do “Manéu” comprar contra-filé, seja para ir dar aula ou mesmo um pulo na casa do Elber para estudar música, conversar sobre música e vida, ficaram há quatro meses no Rio de Janeiro.
Há um mês não choro. Há um mês, aos poucos, fui me acostumando com a rotina que me cerca agora: reuniões departamentais, comissões de eventos científicos, viagens para congressos, orientações, aulas, mais reuniões, política acadêmica, vaidade alheia, squash, conversas noturnas com amigos, garrafas de vinho e tulipas de chope. O vazio vai se acomodando no peito, de pouquinho em pouquinho, e vou entendendo, assim, que ficarei por aqui por muito tempo e, enquanto isso, aguardando Ana. Há, ainda, muitos espaços vazios para se acomodarem no peito e na alma, disso eu sei.
Choro agora enquanto ouço Candeia cantado por Teresa Cristina. Talvez, não esteja chorando nem por tristeza, nem por saudade, apenas por quase não chorar mais. Curiosidades do tempo. Choro, talvez, por racionalizar a saudade que me acua dentro do apartamento entre livros, discos e a flauta que, ultimamente, tem soprado apenas canções que falam do meu Rio de Janeiro.
Coisas da vida. Ontem, ao término de uma aula minha, uma aluna veio me perguntar como é sair de casa para tão longe (ela está pensando em fazer concurso para outro estado). Fui enfático: é ruim. Você chorará todos os dias. Haverá sempre um aperto no peito, um nó na garganta quando falar da tua terra, dos teus pais, da sua origem. Mas você se acostuma.
O conselho que a dei, foi o mesmo que ouvi, certa vez, do Kiko, no período em morei com ele aqui em Aracaju. Lembro-me bem da conversa e ainda hoje, já quatro meses depois, ainda marejo os olhos como marejei naquele dia em sua cozinha.
E continuo entre livros e discos. Leitura e música são coisas que não me largam nem na lua. Hoje, quatro meses depois de sair do Rio de Janeiro, cinco dias depois de ter ouvido sua voz, meu pai me ligou para matar saudades. Não comentei que tenho dormido mal, que tive febre no domingo – resfriado mal cuidado, talvez, ou mesmo a própria saudade – me perguntou o que eu estava fazendo: estudando um pouco. “A coisa continua, né, filhão? As leituras não param!” disse ele rindo.
Ontem, foi aniversário da minha mãe. Liguei para ela e desejei saúde. Dei beijos e saudades. Um minuto e pouco de conversa – não havia muito que dizer, realmente. As palavras já não tem bastado muito.
E tem sido assim com todos que me ligam do Rio de Janeiro. Não há muito que conversar. Se eu prolongar um papo por mais de dois minutos, a garganta se fecha, me falta o ar e as palavras se transformam em lágrimas. Até com meus pais, meu primo, minha Ana, até com eles as conversas tendem a serem curtas agora. Os olhos doem, uma pressão horrível vai trazendo de forma dolorida as lágrimas salgadas como água do mar.
Me refugio por aqui, atrás das muitas vozes que crio n’O Ventríloquo. Me acalmo com os comentários dos amigos, dos desconhecidos, de quem passa por aqui e deixa uma voz que seja, um sonzinho que seja, algo que emita um palpitar, uma conversa. Desde o início, há quatro meses, quando se concretizou o primeiro dos sonhos profissionais: ser professor universitário federal, seguir com os estudos, agora como docente, em História Medieval, desde o início, eu sabia que não seria fácil: mas quem disse que tem que ser?

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Carta a São Sebastião do Rio de Janeiro

Vista do Rio de Janeiro - Foto de Bruno Alvaro

Querido Rio de Janeiro, há quatro meses te deixei com algumas folhas caindo no chão e um vento frio prenunciando o inverno. À sua guarda, deixei meus pais, minha noiva e meu primo chorando aos pés do Galeão.
Prezado Rio, não pense que não te quis ou não te amo mais. Porém, foi a força do destino e a vontade de mudança que me trouxeram para cá. O que não significa que não haja um dia sequer que eu não pense em você, nas tuas praias, tuas matas, as favelas e o teu sol.
Confesso que ainda cultivo hábitos cariocas como a cerveja gelada e o futebol. Mas, nas mesas de bar, sinto falta dos brindes animados da juventude no Centro Antigo, em pés sujos como o Bar das Putas e o Araponga. Meu Rio de Janeiro, vou eu em alta madrugada te exaltando por aqui!
Sei que o nosso relacionamento sempre foi confuso como o chocalhar dos trens lotados que cortam tua Baixada Fluminense e teu subúrbio. Tantas cascas duras em Cascadura e Madureira madrugueira. Como eu gostava de ir ver Ana em Fazenda Botafogo, aqui e ali em Acari. Depois seu riso tão branco e amável em Del Castilho e sentar na praça pr’á nos divertir – que saudade do Subúrbio!
Da Zona Norte guardo as noites na Praça Vanhargem, na Tijuca, dos amigos, da sinuca! A Lapa no Centro, a Lavradio lotada, a gafieira no Rio Scenarium, a caipirinha na frente do Circo Voador. Que saudade do bondinho de Santa Teresa, de sua vista realeza e dos seus muitos bares acesos.
Na Zona Sul me perdia com as luzes de Copacabana, com a beleza da Urca, com o charme dos cinemas de Botafogo.
Meu caro Rio, há quatro meses estava eu sentando no Amarelinho comendo codorna recheada, degustando um bom chope gelado e ao lado da minha bela mulata. Há quatro meses. Saímos para caminhar abraçados depois na Cinelândia, com uma lua grande no céu e um ventinho fresco que chamava a madrugada, ameaçamos uns passos rasos no meio da praça... Cheios de graça.
Amigo São Sebastião do Rio de Janeiro, minha flauta andou muda, mas, ainda ontem, ensaiei Corcovado e Futuros Amantes só pensando em ti. Uma coisa meio tamborim é meu coração por aqui, se eu ouço um chiado na fala de alguém, me sinto um pouco aliviado de não ser o único carioca nessas terras distantes daí!
Uma coisa meio Vinicius de Moraes essa minha carta para ti, eu sei! Mas assim como o poetinha quero eu voltar pr’aí.
Um dia, quem sabe, meu Rio de Janeiro, minhas cartas diminuam em suas linhas o peso que tem o assunto da saudade. Quem sabe?
Eu só sei, que, por enquanto, vou levando e sonhando. Ouvindo samba. Te cantando, sozinho por aqui. Agora, meio mórbido e nostálgico, eu queria muito te pedir se acaso eu padeça, morra aqui, que você me aceite, me receba novamente em teus braços, pois no fim da minha vida, é a terra carioca que eu quero para mim.
Meu Rio de Janeiro, um forte abraço, eu demoro, mas não tardo, a aparecer por aí!

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A gente vai ficando velho... (Os sinais do tempo)



Os indícios da velhice são curiosos. Apesar dos 26 anos que me caem até bem, a vida sossegou para mim. Assim começo a prosa de hoje: reflexivo e engraçado até! Alerto que nosso bate papo vai ao som do belíssimo disco A Sedução Carioca do Poeta Brasileiro de Moacyr Luz sendo acompanhado pelo maravilhoso sexteto de choro Água de Moringa – qualquer dia desse falo sobre o trabalho no blog Retropleco.
Bom, eu estava falando sobre os sinais da velhice, no meu caso, vindo mais cedo. Ontem – ontem já, não é? É madruga, então sim! – fui dar minha rotineira aula de História Medieval I na Universidade Federal de Sergipe, cheguei um pouco mais cedo, pois queria atualizar algumas coisas, me sentar um pouco na minha sala, relaxar no... silêncio?!?!
Na quarta-feira estavam montando um palco próximo ao prédio do Centro de Educação e Ciências Humanas, quando passei de tarde com um amigo, não demos muita bola, nem sabia o que era e nem quis saber. Descobri hoje! Uma festa universitária, até aí, nada demais para mim que fui freqüentador assíduo com meu amigo Thiago Porto, na época do IFCS-UFRJ, das festinhas promovidas pelo CAFIL e outras pela galera do PSTU. Bom, nordeste, forró. Rio é samba. Tanto um quanto outro, penso eu, combinam com sexta-feira a noite. Penso eu. Mas não é bem assim...
Enquanto ainda estava silêncio, relia eu Ano 1000, Ano 2000: na pista dos nossos medos do Georges Duby, quando, de repente, tudo treme! Sanfona pr’um lado, arroxa pr’o outro... Desci, faltavam ainda uns 30 minutos para minha aula, encontrei uns alunos e uns orientandos. Conversa vai, conversa vem, percebi que eles estavam mesmo com vontade de curtir um forró do que ouvir sobre História Medieval – natural isso. Acontecia comigo, só que por causa de rock ou mesmo samba. Liberei os que estavam a minha volta, fui para sala lecionar para os poucos que ficaram comigo e abonei as faltas até daqueles que nunca apareceram.
Mas não é por isso que me senti velho. Não é contraponto: energia deles, juventude deles (que é a minha também, já que alguns quase têm a minha idade) e cansaço meu. É uma coisa diferente. Uma coisa do sossego. Já não tenho mais o mesmo pique. Agora você até me questiona: mas você é tão jovem! Sim, concordo. Mas viver como vivi e o que vivi. Os abismos que me lancei. A entrada na universidade cedo demais. O mestrado. O doutorado. Encontrar Ana: sossego. Acho isso engraçado. Ensaio uma saída com o Kiko: desisto. Até porque ele também é assim! Vamos ni ritmo coca-cola de ser: quando abre a garrafa, muito gás, depois, vai ficando xoxo.
O primeiro sinal de que se está envelhecendo é quando sossegamos o coração. Quando ser quer o samba em casa. Quando se quer a flauta serena e não mais ponteando em saraus madrugueiros. Gustavo que o diga! Já viramos noites tocando violão e flauta e bebendo, bebendo e bebendo! Thiago Porto que o diga: quantas noites não vimos nascer no Abracabra? Na Lapa? Ana que o diga: quantas vezes não nos aventuramos sem lenço e sem documento pelas ruas do Rio de Janeiro? Quantos carnavais? Quantas vezes não dancei a valsa do trocar de pernas?

O samba agora está em casa. De vez em quando até uma cerveja com um ou outro antes de voltar para o mingalzinho de cremogema. Mas é de vez em quando. O samba está em casa.
Nessa mesma quarta-feira do palco sendo montado que anos atrás não me passaria despercebido, aconteceu outra coisa curiosa (o segundo sinal da velhice). Chegou para mim, LP raríssimo. De um lado, Tom Jobim tocando pela primeira vez em disco Águas de Março, inclusive, única gravação que ele só canta e não toca instrumento nenhum (já fica raro por isso, sem contar o andamento da canção, completamente diferente do comum). Do outro, um tal de João Bosco, com seus 24 anos, desconhecido ainda. Bom, se o João Bosco, ainda era desconhecido nesse disco, um mero, digamos, sonhador, é raro mesmo e antigo!
A bolachinha, chamada O tom de Antônio Carlos Jobim e o tal de João Bosco, faz parte de uma série intitulada Disco de Bolso, uma tentativa, que durou apenas mais um número (com Caetano Veloso de um lado e um estreante chamado Fagner de outro), da revista O Pasquim de impulsionar o lançamento de novos artistas. Foi vencido pela censura ditatorial dos anos 70 e pelo mercado fonográfico que já era massacrante naquela época.
Bom, a revista-disco raríssima é digna de todo meu orgulho. Eu tinha que mostrar para alguém que entendesse. Kiko, não tinha dado as caras no dia. Gustavo estava no Rio de Janeiro. Minha Ana, atarefada com coisas do nosso casamento, não ia ouvir direito e sacramentar minha velhice. Me restava o grande Augusto, gaúcho que chegou à UFS quase ao mesmo tempo que eu, umas semanas depois, para lecionar Teoria da História e que tem sido grande amigo aqui. Além de ser um augusto (sempre faço esse trocadilho com seu nome) conhecedor de vinhos e música boa. Nesse caso estou bem: somo ele e Kiko e tenho uma enciclopédia de boa música! Sem contar que de um lado meu amigo carioca assistiu show antológicos que eu não me canso de pedir que ele conte e reconte e, do outro, o gaúcho, tem no currículo da vida (esse é melhor que qualquer Lattes) nada mais nada menos do que dois shows ao vivo do grande Gonzaguinha! Continuando...
E ficamos os dois, ali, no carro, olhando o disco, a revista, os olhinhos brilhando, como se fosse a coisa mais fantástica das nossas vidas! Várias interjeições gaúchas e cariocas se misturando ao olhar atento para um Tom Jobim sentado recostado numa árvore, tocando flauta transversa, lendo uma partitura, estampada na parte de trás do biquíni de uma mulher vantajosa (a foto acima). Estamos ficando velhos.
Terceiro sinal: Eu vou casar. Prefiro a poesia em casa, com a cerveja gelada em casa, com a preta em casa. Vou casar. O sossego prova isso. A vontade e o cheiro do sossego. As cadeiras de praia no domingo. O pão quente de manhã. A saudade apertando. A lembrança de um tempo que vai ficando para trás... Lembrança que não é saudade, é apenas lembrança. E o sol só nasce na minha cama agora: deixo a vida solta para meus alunos, já tirei meu time de campo!
Aliás, querem coisa mais velha que ficar lembrando as coisas? Quer coisa mais velha que ser um ventríloquo, puxar conversas longas e escrever e-mails enormes? Pois então!
O quarto sinal, eu teria vários, mas esse é o último, vem inversamente. Porém, pode ser o quarto. Dia desses fui almoçar na casa de um aluno. Uma festa. Um dos dias mais alegres e familiares que tive em Sergipe. Aquela família grande, tipicamente nordestina, receptiva, carinhosa e brincalhona. Lembrou a minha e isso me fez ficar à vontade (como se fosse difícil). Pois bem, eis que falta gelo para a cerveja! Aventura! Pegamos o carro do pai do Aquino e fomos atrás desse elemento fundamental para qualquer cervejeiro (tirando a cerveja, é claro). Rapaz, eu não lembrava como era gostoso essa coisa de pegar um carro de pai emprestado e ir pelas ruas sem saber o rumo certo. O que me pareceu era que o carro era tão desconhecido para mim quanto o era para os demais ocupantes! Liga rádio. Não Liga rádio! Como se liga o rádio? E esse negócio do gás natural? Aventura! Na última voz d'O Ventríloquo, eu rememorei meu encontro com o Douglas Cezário e narrei a história do fusca do avô do Bruno Henrique (nosso guitarrista) e dos outros carros da nossa adolescência. Bom, é sinal de velhice! Sinal de velhice maior foi ter ficado super cansado após a busca pelo gelo. É, tempos outros, que venham outros para me substituir!

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Memórias musicais

Estava aqui pensando no que falar, quando, de repente, me deparo com meu grande amigo Douglas Cezário no MSN e dá-lhe perguntas: “Como vai o Rio de Janeiro?” “Está chovendo, está sol?”... Só para pontuar bem o contexto, conheci o Doug, lá pelos idos de não sei quando. Me lembro que eu estava num sítio, em Xerém-RJ, que pertencia a PIB de Presidente Juscelino (igreja que minha família fazia parte, na verdade, ainda faz) conversando com o Bruno Henrique Louroza, amigo de mesma congregação, ele me falou de um carinha da PIB de Mesquita que cantava pacas e tocava razoavelmente mal (ele vai ficar uma arara, mas... apesar de ter estudado vários instrumentos, Doug sempre foi enrolado com as notas e acordes)! Me disse que esse cara estudava Zootecnia no Colégio de Aplicação da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e tava precisando de um baixista para tocar com ele num festival de alunos de lá. Balancei a cabeça e fui jogar bola. Na época, pasmem, eu cursava o último ano do 2º Grau em Administração de Empresas! Não me lembro bem porque eu estudava aquilo, mas já me preparava para o vestibular em Sociologia na UERJ.
Semanas depois, me lembro de estar dormindo em casa quando bate no meu portão o Bruno Henrique com o fusca do avô dele (eu tinha 15 anos na época e ele 16), me dizendo para pegar um caderno pautado (caderno de partitura) e ir com ele até a PIB de Mesquita, mas tinha que ser rápido, pois, para o avô dele, Bruno estava lavando o carro na frente de casa! Ainda não entendi o motivo do caderno de partitura, já que ninguém lia merda nenhuma!
Ainda meio zonzo, coloquei uma bermuda e entrei naquele carro marrom sem entender muita coisa, mas aventura é aventura quando se tem 15 anos e pegar o carro do avô emprestado, um fusca de único dono, o avô do Bruno, e que foi comprado zero quando ainda era carro de rico (no tempo da vovó virgem), era aventura das boas. Fomos nós para a PIB de Mesquita – ah, vale lembrar, meio tardiamente nessa altura da prosa que PIB é a abreviação de Primeira Igreja Batista. Ou seja, é a primeira igreja fundada no local. Assim, no município de Mesquita tínhamos várias PIB’s nos diversos bairros, eu e minha família e o Bruno Henrique (indo e vindo entre a PIB de Mesquita) pertencíamos a do bairro de Juscelino Kubistchek.
Encontrei Douglas Cezário, jovem alto e magrelo, com sorriso grande e voz engraçada sentado esperando. Nos apresentamos: “Esse é o Bruno Alvaro” disse o B. Henrique. Influências para cá e para lá, similitudes. Me mostrou duas canções, lembro de uma ou pelo menos do refrão: “linda, rosa, flor...”. Eu ri. Mas gostei da voz dele. Puta voz aquela, uma coisa soul music que eu ainda não tinha ouvido de um garoto da nossa idade, apesar dele ser um pouco mais velho que nós, um, dois anos, talvez. Mas lembro que já tinha carteira de motorista e pegava o carro do pai de vez em quando para andarmos por Mesquita... anos depois ganhou de presente um Chevette hatch que era a alegria da galera! Mas voltando ao papo...
Explicou o motivo do convite. Precisava de um baixista que tocasse com ele e nosso amigo em comum na UFRRJ no dia seguinte. Aceitei. Eu havia estudado violão com o professor de teclado dele, o Renato, havia um certo conhecimento do que a garotada das igrejas Batistas andavam fazendo, eu já tinha ouvido falar dele, talvez, já tivesse ouvido falar de mim. Fizemos o arranjo. Ensaiamos uma vez apenas. Dormi na casa do Bruno Henrique e o encontramos na manhã seguinte para pegar o famoso ônibus da empresa Ponte Coberta: Nilópolis X Seropédica. Viagem longa, muito longa! Era a primeira vez que eu ia na UFRRJ, anos mais tarde, já mestrando, participei de uma Anpuh regional lá, 2008, e me lembrei com carinho daquele dia de música estudantil. Ganhamos o 2º e 3º lugares. Muitos anos depois, eu contando para Ana, minha futura esposa, qual não foi a surpresa? Ela conhecia a história através de um amigo que havia estudado no Colégio de Aplicação com o Doug e estava lá no dia! Coisas da vida!
O resto é história! Foram muitos sábados e domingos carregando amplificador, caixas, guitarras e pratos! Entrei para a universidade um ano depois, Sociologia na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, acabei desistindo após alguns meses e indo cursar História, foi a primeira decisão correta na minha vida, a primeira de muitas! Douglas entrou um pouco depois para Biologia, escolha natural. Gostava da área, era bom naquilo, havia feito um bom 2º Grau, numa boa escola... Como eu disse: o resto é história!
Certo dia, eu estava passando um final de semana em Paquetá com Ana e resolvemos pegar a barca e atravessar a Baia de Guanabara para ver no extinto Palácio (cinema de rua maravilhoso no Rio de Janeiro que acabou sabe Deus por qual motivo), Batman – O Cavaleiro das Trevas. Quem eu não encontro lá, com uma nova namorada? Um papo rápido e ele diz que tem algo importante para contar...
No fim da sessão, na pressa de pegar a barca para voltar à Paquetá, ele me puxa rapidinho pelo braço e diz: “Vou ser pai, meu caro... de gêmeos!”. Fiz uma cara de surpresa... Ele riu, aliás, nunca vi o Douglas puto com alguma coisa! Sempre sorrindo para tudo e para todos! Vê sempre o lado bom das pessoas e das coisas. Levando em consideração que os rebentos eram com uma antiga namorada e ele, como sempre, já estava com outra: à procura do amor, como ele mesmo sempre dizia!
Dia desses, me vem ele dizendo que está namorando uma prima minha: “Cara, sou teu primo!”... E eu: “que merda, Doug!” como sempre ele deu aquele riso gostoso e aberto... “Pois é, meu caro, estou namorando a tua prima!”.
Mais um tempo se passa e hoje de madrugada vem ele: “Minha irmã casa sexta-feira!” e eu: “E você casa quando com a minha prima?” imagino que ele tenha rido antes de escrever a resposta no MSN: “Bom, estou pensando em daqui a três anos...” pensei comigo na hora, como um estalo: “Acho que crescemos, ele já pensa em casamento...!”.
Abração Doug! Ging véi!


Ps. A voz de hoje, evidentemente, foi em homenagem a esse cara super gente boa, pai de gêmeos (que não, não são filhos da minha prima). Bom pai. Professor de Biologia do Estado do Rio de Janeiro. Grande conhecedor de Botânica, maravilhoso cantor e grande contador de causos! Claro, meu amigo!
Ps. 2 A foto é de 2007, eu tinha acabado de entrar no mestrado e ainda achava que daria para equilibrar pesquisa, vida de professor e música em grupo! O que, é bem observável: não aconteceu, né?

domingo, 13 de setembro de 2009

Praça XV – 10 de janeiro de 2007

Começamos bem
Quando ficamos sós
E ontem, antes de duas garrafas de vinho
Massa e boa prosa com um amigo
Me lembrei do beijo doce na Praça XV
Pois o Rio era só nosso
O sol beijava o mar ao longe
A Perimetral parou
Na Primeiro de Março silenciaram os carros
E nem era dia de domingo
Entre choro e samba
Entra e sai de gente
Começamos bem
Quando ficamos sós
Só nós dois entre a multidão e o vai e vem do Rio
A 7 de setembro era só mais uma data em rua
A Uruguaiana só um ponto de referência
O Largo de São Francisco ficou estreito por nós dois
A Lapa, a praia, o bonde, tudo se entrecruzava
Enquanto tudo era um beijo
Meu e seu
E ontem, após duas garrafas de vinho
No silêncio do escritório
Com a claridade clarividente
De que mais um dia raiou
Transformando o ontem em hoje
Percebo que não há nada melhor no mundo
Que ter teu nome grafado num pedaço grande da minh’alma
Pois enquanto o dia acorda
Num provável dia calmo de domingo
Me lembrei da Praça XV
E no beijo doce que dei em você.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Bantu Steve Biko: a voz que ninguém pôde calar...


Há, aproximadamente, três ou quatro meses que me vem uma vontade enorme de falar sobre Bantu Steve Biko. Fui adiando o desejo por uma série de fatores: mudança, viagens, noivado, casamento, saudade... Sentimentos que foram me tomando a alma e acabaram postergando essa voz para, quase, à mudez.
O interesse por Biko nasceu, como quase tudo para mim, na música. Sou um grande fã da banda de rock progressivo Genesis, o que, mesmo não sendo regra de fato, me faz gostar, também, de Peter Gabriel, fundador do grupo e vocalista até 1974. Já discuti isso por aqui n’O Ventríloquo.
Gabriel sempre foi, assim como Phil Collins, envolvido em causas humanitárias e no ano de 1980 lançou a canção “Biko” (no disco “Peter Gabriel 3”, também conhecido como “Melt”) em protesto à morte de Bantu Steve Biko no ano de 1977. A música tomou uma proporção enorme, eu não era nascido, talvez, você também não. Porém, o som torna-se quase que atemporal, diferente, infelizmente, dos fatos que, muitas vezes, são esquecidos na memória. Este é o caso da morte de Steve Biko e eu quero, justamente, gritar sobre isso hoje. Apesar de saber que sua voz nunca foi calada, nem naquela cela, nem em lugar nenhum...
Talvez, muita gente tenha visto o filme “Um grito de liberdade” (Cry freedom) de 1981. Bem, não é do filme que eu gostaria de conversar hoje já que isso aqui é conversa de bar, pois são nas cadeiras amarelas ou brancas, com marca de cerveja no centro e nas costas, que travamos nessa vida os maiores embates e temos, ainda, as melhores idéias. Segue minha crítica então, quase berrando, quase clamando por atenção... Mas, antes, eu queria alertar que a Sétima Arte, ficará de fora dessa vez, só dessa vez.
Apesar do filme, apesar da música, Bantu Steve Biko é pouco conhecido pelo grande público, à exceção daqueles que são ligados, de alguma forma, aos movimentos contra racismo: ativistas, estudiosos, etc. Aí é que está o grande problema, sobre Steve Biko e sua saga, sua vida e morte em prol do fim do apartheid, deve-se falar nas escolas, nas praças públicas, deve ser conversa de bar... Pois a segregação não acabou, talvez, em alguns lugares, como o Brasil, ela seja mais mascarada, veja bem, não entenda “mascarada” como contida. O brasileiro é racista, é um povo racista. Homem cordial? Alguém leu e não entendeu direito a tese do Sérgio Buarque de Holanda, pois aqui também tem isso, a gente lê as coisas e não entende: adapta como acha melhor.
Steve Biko foi morto covardemente no dia 12 de setembro de 1977 – só agora percebi que a data do aniversário de sua morte se aproxima. Para ele fizeram um filme, fizeram uma bela canção. O mundo mudou? Não! O apartheid como regime pode ter se extinguido, mas a segregação se foi? Indico aqui a ótima dissertação de mestrado de Ângela Aparecida Gonçalves Oliveira, defendida em 2008, na Universidade Estadual de Maringá, pois é, sou medievalista de pesquisa e profissão, mas estou atento a outros assuntos!
No dia 7 de outubro de 2003, segundo pesquisa que fiz na internet para argumentar com mais propriedade a melodia de hoje, os guardas envolvidos na morte do ativista foram absolvidos por “falta de provas”.
O curioso é que fico com a sensação de que a letra de Gabriel continua atual e isso me deixa preocupado e triste:

When I try to sleep at night
I can only dream in red
The outside world is black and white
With only one colour dead


Bom, não é preciso ter um inglês tão fluente para entender esse trecho da letra, que é mais ou menos o seguinte: “Quando eu tento dormir à noite/ Meus sonhos são vermelhos (ou eu somente tenho sonhos em vermelho? Não sei... não confio muito no meu inglês)/ Lá fora o mundo é preto e branco/ Com apenas uma cor morta.”.
Fico aqui pensando se realmente “(...) the eyes of the world are watching now” (“os olhos do mundo agora estão vigilantes”), pois como diz o mesmo Peter Gabriel na canção: “The man is dead”.

Fica aqui minha homenagem a Bantu Steve Biko e meu desejo que sua voz, sua vida e morte ecoem durante muito tempo!

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Centésimo post: tudo iluminado!

Há dias que estou com um som na cabeça, martelando, ecoando – e de eco, estou ficando especialista. A estrutura nasceu na rede aqui do apartamento, revendo meu próprio tempo, melhor, o tempo d’O Ventríloquo. Só hoje, após chegar em casa que recaiu sobre mim a luz: a luz de cem postes!
Pois é, é o centésimo post aqui no blog, que há quase dois anos nasceu com uma proposta simples: “(...) uma fuga aos demasiados textos poéticos que não escrevo. Talvez seja também a necessidade de escrever alguma coisa a mais para mim. Não há formatações. Mas...” (http://oventriloquo.blogspot.com/2007/09/o-teste.html). A conjunção adversativa ainda hoje continua sendo utilizada constantemente.
Me auto citar não é à toa. O primeiro post, como denominamos no mundo bloggeiro, intitulado, somente, “Teste”. Já ia explicando à que veio O Ventríloquo. O tempo foi amadurecendo as “vozes”. Preferi utilizar sempre as metáforas musicais, sonoras, pois o que eu escreveria nesse espaço, seriam conversas, pensamentos, em grande parte, soltos, muitos devaneios, aliás. Melodias, ora harmoniosas, ora fora do tom. Assim, como Bentinho em Dom Casmurro, eu enxergo a vida como uma grande sinfonia: com seus altos e baixos.
Dia 26 de setembro próximo, esse espaço completará mais um ano de vida e segue seguindo na contramão do tempo. Mas há um antes e os antes são sempre importantes para mim. Novas vozes têm se ajuntado à minha e formando um rico coral de diferenças e similitudes – estou alcançando meus objetivos. Não há formatações.
Eu até cheguei a ensaiar o antes, contar a história do blog, do que me fez escrever aqui, como cheguei até o conceito d’O Ventríloquo, porém, ficou mais chato do que está... Decidi, então, seguir por outro caminho. O resumo da ópera é que eu queria me libertar, queria enrolar enquanto escrevia, quase ao ponto do cansaço do leitor, pois nem me importava muito com quem iria passar por aqui. Isso mudou, deixei para lá esse negócio de não ter a ponta do novelo e agora vivo procurando o fim. Pois comecei a ser ouvido e acho que tenho sido bem, no limite do que é isso aqui, sucedido.
Acho que o fui, acho que estou sendo. Ganhei amigos por aqui. Gente de longe, como o Diego Viana, da França, e seu blog fantástico Para ler sem olhar (http://diegoviana.opsblog.org/). Ou as poesias da paulista, radicada no Chile, Beatriz Santrozi (http://porondeandaranicanor.blogspot.com/). As loucuras do Gustavo Alvaro e seu Intelecto Fútil® (http://intelectofutil.blogspot.com/). O stand up comedy virtual do Ora, bolas! e seu humor levado à serio, no Humor é coisa séria!. (http://comediaemblog.blogspot.com/). Como não citar, os textos áureos do meu amigo André Lemos no seu Miscelânea de Opiniões e Sentenças (http://o-andarilho-e-sua-sombra.blogspot.com/). Ou as considerações religiosas e devocionais do Marcelo Fernandes (http://mfpmarcelo.wordpress.com/). Claro que tem música, como esquecer do recém-chegado nos meus favoritos: Dub-o-matic, do camarada Aquino (http://dub-o-matic.blogspot.com/) que me indicou seu trabalho no último ônibus Campus X Orlando Dantas, depois de uma das minhas aulas de História Medieval I? Ou mesmo do Retropleco: http://retropleco.blogspot.com. É muita coisa! São muitos parceiros! Agora vejam só, tenho até 10 carinhas que dão voz por aqui também! Obrigado gente!
Pois no fim das contas, quem faz isso aqui somos todos nós, ainda não expliquei, mas a tese de que somos gente continua valendo para mim! Muita luz para vocês, pois aqui, aqui a gente tem cem postes!



Ps. Ainda falarei esses dias sobre meu domingo em família sergipana! Fortes emoções, aguardem... Afinal, “ô professor, bacalhau também é bicho!”.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Um Quixote em Aracaju: impressões estrangeiras de um novo sergipano

Cidade maravilhosa
És minha
O poente na espinha
Das tuas montanhas
Quase arromba a retina
De quem vê

Trecho de Carioca (Chico Buarque As Cidades – 1998)


Pensando bem, pensando fundo, ainda não esbocei minhas impressões sobre minha nova terra: Sergipe. Claro que minha voz não terá um alcance tamanho, a ponto de esboçar quais seriam realmente os mistérios sergipanos. Melhor, na verdade, encurtar a canção e narrar com os olhos da voz a cidade de Aracaju.
Pois aqui é assim, há um descompasso grande entre as regiões do estado, isso eu observo pela fala dos meus alunos que, aliás, têm se tornado impressionantemente agradáveis comigo. Levando em consideração minha especialidade, meu foco de pesquisa, ser bem recebido aqui por quem mais me interessa – eles – foi algo muito especial. Então, de certa forma, a melodia de hoje, a voz de hoje, vai para eles: minha primeira turma na Universidade Federal de Sergipe.
Sei que ainda é cedo para marcar impressões definitivas e palpáveis sobre a turma em questão, mas, no mínimo, e se é esforço ou não, confesso que não parece nem um pouco, eles estão me aceitando muito bem.
Quando pisei aqui pela primeira vez, ainda para fazer o concurso de provas e títulos, juro que pensei: preciso morar aqui. A cidade tem um aspecto que me lembra muito a Região dos Lagos no Rio de Janeiro, Rio das Ostras, por exemplo. Claro, lembrando que mal ou bem, a cidade de Aracaju mantém uma regularidade de bares funcionando, meio, digamos, capengamente, para um carioca acostumado com a noite virando dia, enquanto que na Região dos Lagos, no Rio de Janeiro, a alta temporada se dá no verão e é o que possibilita os bares abertos.
O engraçado, e pelo que me disseram os doutos daqui, é a identidade sergipana, ou a falta dela, eles dizem e eu, até agora, acabo concordando, meio sem graça. A gente que vem de fora vê tanta coisa boa, mesmo sem ignorar as coisas ruins, e o pessoal daqui não percebe o quanto aqui é bom. Os próprios alunos, na grande maioria, e já conheço algumas exceções, não perceberam o passo tão grande dado de estarem numa instituição federal, ainda mais, por ser ela a única universidade pública do estado.
E o mar? Ah, o mar realmente não é lá Copacabana, mas é limpo, o que não é na maioria das praias do Rio de Janeiro, está certo que para chegar até ele, propriamente dito, a gente percorre uma enorme, enorme, enorme faixa de areia que incomoda até os sergipanos! Mas veja bem, as praias, mesmo em Atalaia, têm um ar virgem mesmo quando estão lotadas. É lindo de se ver o povo todo ouvindo seus axés, forrós e por aí vai. Não há barquinho, não há garota de Ipanema, meu camarada, é forró, trio pé de serra, ou então, muito, mas muito mesmo, forró elétrico – perdão pela conceitualização errada, sou um leigo.
Coisa ruim de Aracaju? Transporte público. Ônibus aqui é uma complicação só. Caindo aos pedaços, sucateados, lotados, demorados, sem horário certo, pior que Japeri X Central no Rio de Janeiro em horário de pico! Acredite, eu sei do que estou falando. E as filas? Que saudade das filas! O pessoal não faz fila não cumpadi! Dar lugar para mulher? Vagãozinho rosa, é coisa de metrô do Rio, aqui é papo de macheza! Se você, der uma de cavalheiro, permitindo alguma dama passar a sua frente, um bando de gente te deixa para trás (sim, até aprender já perdi muito ônibus por falta de espaço). No início era engraçado, agora faço parte daqueles que odeiam o Terminal DIA (Distrito Industrial de Aracaju).
Dirigir aqui é aventura. A maioria parece que comprou a carteira, mas, sem participar das aulas de direção. Pois carteira de motorista todo mundo compra, mas uns participam das aulas, pelo visto, a maioria aqui não. O engraçado é que até mesmo quem dirige aqui reconhece a barbeiragem. Camarada, Deus não dá asas a cobra, o trânsito é uma maravilha comparado a Rio e São Paulo e eles aqui reclamam. Mesmo assim, até isso é gostoso e divertido em Aracaju.
O povo daqui? É brasileiro e vai bem obrigado. É engraçado, é bonito, tem o charme deles, cor, sotaque... Gente feliz. De um pronto... gostoso de se ouvir, quase infantil até na voz dos mais velhos. Um ié? que só quem é daqui sabe dizer. De vez em quando um êta caralho...! sai dos mais revoltados e, claro, o filho do cabrunco, xingamento mais forte, ainda não ouvi contra mim, espero manter longe! Pelo menos até eles verem as notas!
Eles não brindam o copo gelado e suado de cerveja. Curioso isso, não há esse hábito. O copo se enche, cada um toma o seu e vamos que vamos com a vida e a prosa. Senti falta disso. Dia desses, reclamei com um aluno. Recitei o famoso ditado “um dia sem brindar, dez anos sem trepar”. Coisas de carioca. Coisas de carioca. Me lembro que na época de mestrado dava até briga se alguém bebesse antes de brindar no Araponga ou no Bar das Putas! Kimon então era um dos revoltados. Grande tijucano...
Me sinto um Quixote aqui, um tanto inocente à realidade desse povo que me recebeu tão bem. Que quero aprender sobre, ajudar e, principalmente, ser ajudado. No condomínio, para os porteiros e faxineiros, sou o “Carioca”, para os mais recatados “Seu Carioca”. Me perguntam sobre a PM do Rio, a violência, as praias, as mulheres, o samba, ah, o samba!
Tai o curioso da vida, Gustavo quando me telefona ou me escreve, sempre me trata por “Sergipe”, vai ver que é isso, meu primo irmão, para vocês aí no Rio de Janeiro serei de agora em diante o “Sergipe”, mas aqui, aqui meu camarada, eu sou o “Carioca” e que me perdoe você, bem mais carioca que vocês aí!
O Quixote continua guerreando contra os moinhos de vento e eu, eu só deixo o vento invadir meu apartamento, me deito em minha rede, tomo minha cerveja gelada, leio um bom livro, ouço o bom e velho Chico Buarque e me lembro, logo, logo estarei no Rio de Janeiro, mas meu lar, meu lugar, minha terra, agora, mais que nunca, é Sergipe... Aliás, “pense numa coisa boa” e você vai acabar parando aqui!