quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

A última voz do ano

É, muito provavelmente, essa será a última voz que solto por aqui no ano de 2008. Proveitoso ano de 2008.
Eu poderia gritar as conquistas deste ano, os erros, os acertos, os acontecimentos como numa prévia retrospectiva. Talvez, seja isso mesmo, uma voz introspectiva querendo falar sobre o que passou. Porém, o ano ainda não terminou.
Dois pontos foram fundamentais. Duas notinhas, ali, bem pautadas, muito bem encaixadas no pentagrama: o término do mestrado e a aprovação no doutorado.
Provavelmente, no ano que vem, aliás, em janeiro O Ventríloquo faz exatos um ano nas ondas sonoras das palavras, falarei sobre como foi o processo seletivo para o doutorado.
Mas hoje deixo por aqui o gosto bom de um presente de natal. O dar e o receber. Não, não foram as conquistas acadêmicas meus maiores presentes, mas uma vitrola Philips 503 (Mono) que ganhei de Ana.
Concordo que o som dos Cd’s são melhores, encorpados, etc e tal, mas ouvir Chico Buarque na vitrolinha, ouvir um chiadinho inicial é indescritível. Ok, eu também tenho o Box com os três primeiros discos da carreira do Chico relançados em Cd, mas pegar o primeiro disco do cara, aquela capa grande, pôr na vitrola e pensar que você está em 1966...
Nessa leva toda, acabei comprando um ótimo Cd de choro: Pinxinguinha + Benedito – Mário Sève + David Ganc. Ótimo trabalho de releitura dos grandes choros dos mestres!
Fica aqui o prenúncio de um ano bom, de um próximo ano bom. Pois é, não falei muito hoje, não foi crônica, não foi reflexão, não foi pensamento, acho que nem voz. Mas é o que é. Eu juro que pensava, semanas atrás, em conversar sobre minhas impressões acerca do natal, que não se modificaram muito, mas esse ano o amor pesou forte, pesou muito.
Paz a todos e fica o agradecimento aos que dialogaram de alguma forma comigo, citaria nomes aqui, inúmeros nomes. Feliz natal!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Há dignidade no morrer?

Hoje acordei com duas notícias. Não vieram, necessariamente, ao mesmo tempo. A primeira me pegou sonolento, tanto que voltei aos embalos do sono. O segundo acordar se deu com o toque do celular e a notícia de que eu havia sido considerado apto no exame de língua estrangeira e que minha entrevista para o doutorado ocorrerá amanhã. Fixemo-nos na primeira notícia.
No episódio piloto da série televisiva americana House M.D. há um diálogo entre o médico ranzinza e uma paciente, no qual, após ele ouvir da moribunda que a mesma queria morrer “com dignidade”, House afirma que não há dignidade na morte (...).
A primeira notícia da manhã, dada por minha mãe, era de que sua avó paterna (conseqüentemente, minha bisavó) de noventa e poucos anos havia falecido. Como falei anteriormente, não por insensibilidade, voltei a dormir e, confesso, até esqueci a notícia, confesso, também, que, nesse exato momento, enquanto solto essa voz por aqui, meus pais se preparam para ir ao sepultamento. Não, não vou. Um dia conversaremos sobre meu problema com cemitérios e velórios, na verdade, mais com velórios que com cemitérios. Ao som do ótimo Cd Surpreendente Graça, do cantor e compositor Jorge Camargo, continuemos nosso papo.
Quando me levantei definitivamente, lá por volta das onze da manhã, fui ao quarto da minha mãe contar a notícia da aprovação no exame de proficiência. Só então me lembrei da morte da bisa. Matriarca da família Gonçalves.
Pelo que me recorde, minha bisavó já enterrou dois filhos (incluindo o grande e fantástico Altamiro Gonçalves, meu avô, o cara que me levava para tomar Malzibier), um neto e acho que já tinha até trisnetos. Era Batista convicta. Uma peça rara. Mulher forte de cabelos brancos e longos. Gostava de contar histórias e eu de ouvi-las. Até os treze, quatorze anos, ainda ia muito à sua casa. Uma das minhas melhores receitas de molho, aprendi vendo-a fazer.
Mas, enfim, há dignidade no morrer? Conversando sobre isso com minha mãe, cujo nome na certidão de nascimento é uma singela homenagem à sua avó Isabel, que carinhosamente era chamada de “Vovó Belinha”. Sim. No seu caso houve.
Minha tia a acompanhou em seu leito de morte. Leito rápido que nem sequer chegou a esquentar muito. Morreu conversando. Aos poucos e, ao que parece, sem dor.
Segundo minha mãe, através da narrativa de sua irmã, Vó Belinha conversou, aos poucos disse que estava se sentindo sonolenta, conseqüentemente, sua pressão foi baixando, o sono chegando... o sono eterno.
Não. Há muito não vou a Igreja. Sim. Ainda me sinto Batista, aquele “batistão”, bem tradicional. Porém, não me sinto intolerante, talvez, sarcástico, mas nisso sou com tudo da vida, inclusive na morte. Segundo um grande amigo meu que perdeu seu pai recentemente, os dois umbandistas, morrer dormindo significa que a vida da pessoa foi boa, que a pessoa foi um ser bom, pois, no sono que se converte em morte, ao que parece, para essa religião e, ainda, segundo ele, no Espiritismo, afirma esse postulado e muitos dizem, acho que todos, que não há muita dor (ou quase nenhuma) na morte do sono. Não tenho certeza nesse último caso. Não sei se ao dormitarmos e, conseqüentemente, morrermos, não sentiremos um fio sequer de dor.
Por fim, minha mãe, que já viu muita gente “boa” e “ruim” morrer, discordou (e muita gente o faz, claro) do famoso personagem de Hugh Laurie, existem mortes bonitas e dignas.
No mais, eu realmente até poderia ir ao velório e acompanhar o enterro, pois, acredito, que será uma cerimônia bonita e pelo contexto da morte, pelo tempo que ela viveu, é até um alento o fenômeno incontestável que é o ato de morrer. Não creio que pessoas agarrarão o caixão, pedirão para ela se levantar, em suma, não acho que ocorram manifestações desesperadoras dos que ficaram nesse mundo louco e corrido, cujo tempo não nos dá a mínima dignidade...


Ps. Sim. A foto postada é minha e se chama Isolada, faz parte de um conjunto de fotografias que intitulei de Experimento com luzes.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Uma única voz

(É uma tessitura da voz anterior) Confesso que sou daqueles tipos, poucos, de torcedores que não são apaixonados pela balbúrdia. Explico-me.
Amo, amo mesmo, o espetáculo que é o futebol, mas admito que minha vida não gira nem um pouco, nem o mínimo do meu tempo, a isso. Não vou a todos os jogos do meu time de coração e nem sempre o assisto na tevê. Porém, sou obrigado a explicitar que das muitas sensações em conjunto que um ser humano, um ator social, pode ter, é no estádio de futebol (e imagino que isso se estenda a outros esportes que suscitam paixão) que ele encontrará a “dança dos deuses”.
Milhares de pessoas entoando os mesmos cânticos arcaicos, cuja prosódia musical é desrespeitada constantemente, hinos eufóricos, quase um tipo de mantra... enfim, uma única voz. Definitivamente, uma única voz.
Algumas torcidas são mais exaltadas que as outras. Violentas. Comportadas. Quase apáticas. A torcida do meu time de coração é um tanto criticada por sua atitude quase “Suíça” no Maracanã. Admito que tem seu fundamento se a compararmos com as outras quase tribais. No entanto, também devo, e aqui não estou puxando a sardinha para as belas três cores de minha camisa, que mesmo “comportados” o espetáculo de cores que fazemos é digno de nota.
Afirmo isso pelo olhar compenetrado de alguém que teve a oportunidade de assistir jogos históricos, tirando o tradicional Fla X Flu que devo admitir não ter até hoje ido assistir por receio, medo do comportamento da torcida rival.
Mas minha voz de hoje que, como salientado no início, é uma tessitura do que sussurrei na segunda-feira por aqui n’O Ventríloquo, pretende estabelecer uma ponte entre este, que é considerado o maior espetáculo da Terra, e o limite do amor pelas cores de uma camisa, de um brasão, de um clube de futebol.
Minha voz é verdadeira, não há falsetes hoje por aqui, nem falo em tons difíceis, nada atonal...
Meus caros, entendo o sentimento dos muitos vascaínos que vi chorar na segunda-feira e ouvi na rádio no domingo. Realmente entendo. Compreendo, pois vi, ainda na adolescência, época essa conturbada para ter seu time rebaixado, duas vezes por sinal, o Fluminense ir para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro. Na verdade, ele foi uma e desceu ainda mais um degrau. Parafraseando o, também, tricolor Chico Buarque (na melodia de Tom Jobim): “Meninos, eu vi...” e foi triste, muito triste.
As gozações, as piadinhas de mau gosto. Tudo que sabemos pertencer ao conturbado mundo futebolês. Sim, e,como eu disse, meu time foi rebaixado para a terceira divisão e de lá saiu convidado a voltar para a primeira e esse ano de 2008 quase caiu novamente, porém, no final das contas, reservou-se ao Vasco da Gama a fama de rebaixado.
Uns culpam o Flamengo (?), outros a história do próprio Vasco nos últimos anos de gestão do Sr. Eurico Miranda que, na minha ingênua opinião, mesmo com todos os defeitos, sempre correu atrás dos interesses cruzmaltinos (e dos seus, lógico!). Há outros que culpam o Renato Gaúcho, muitos o Edmundo, até o maqueiro, o massagista, o roupeiro, enfim, todo mundo anda sendo culpado. O que é fato: a situação era crítica e mesmo vencendo o jogo contra o Vitória só mesmo o “sobrenatural de Almeida” (e não sei se ele age fora do Maracanã) para que o time da Colina não caísse!
Não tenho muitos amigos vascaínos, poucos mesmo, posso contar nos dedos da mão esquerda, os que tenho certeza que são: Fernando Gralha, Kimon Speciale, Paulo Duarte, Rodrigo Carvalho, Fábio Oneas e Vinicius Constant. Meu sogro também é vascaíno, mas quase não assiste futebol, nem sei se ligou muito para a nova situação do seu clube, nem sei se onde ele mora o jogo foi transmitido!
Não. O objetivo da voz desse aqui hoje não é fazer piadinha com o fracasso alheio. Tampouco reproduzir as piadas que já rodam pelos bares da vida. De todos, os mais felizes são os flamenguistas, claro. A rivalidade Vasco X Flamengo chega a ser estapafúrdia e, como eu disse, sou um dos poucos torcedores na face da Terra que não aprecia o tumulto que se gera após vitórias e derrotas. Talvez, minha natureza nem um pouco competitiva (para algumas coisas) me vacinou contra as discussões sobre quem é melhor dentro das quatro linhas do campo.
Mas a imagem que mais me chocou foi o individuo suicida que tem figurado os meios de comunicação. Vai entender? Psiquiatras tentam explicar. Sociólogos e até historiadores! Contudo, realmente, me senti compadecido com as criancinhas e os adolescentes chorando nas grades de São Januário. Assustei-me no caminho de volta do Maracanã com meu pai e minha namorada quando, na Avenida Brasil, na altura do bairro de São Cristóvão, vi inúmeros PM’s armados contendo a multidão que até parecia conformada e sem muito alardeio ofensivo.
Compadeci-me, pois passei por isso um dia. Passei por isso num momento cuja tentativa de afirmação, identidade, etc e tal, estava no auge de minha vida: a adolescência e foi uma titica só! É duro torcer pelo time rebaixado, ninguém te escolhe na pelada, todo mundo te azucrina, coisas normais... Mesmo assim, me recordo de ir todo prosa com meu pai ao Maracanã assistir o Fluminense contra times que eu nem sabia que existiam.
O engraçado disso tudo, e agora serei bem particular, voltando a sussurrar, que a conversinha que tivemos tem muito haver com um ótimo livro que ganhei em conjunto de dois professores que tive na faculdade e que se converteram em amigos: “A Dança dos Deuses: Futebol, Sociedade, Cultura” do medievalista (!) Hilário Franco Jr.
O livro é ótimo e iniciei sua leitura recentemente como prêmio de descanso pelo fim do mestrado. Porém, o que mais me chamou atenção foi a última frase da dedicatória do Marcus: “Lembre-se que a vida não é só Idade Média”.
É, acho que a conversa de hoje prova que levei à risca o conselho do mestre... E, amigos vascaínos, paciência, paciência, pois pelo que fiquei sabendo o Vasco da Gama é o único time de futebol do Rio de Janeiro e não tenho certeza se do Brasil também, que entrou no Campeonato Brasileiro pelas vias competitivas, ou seja, antes de jogar a primeira divisão, jogaram a segunda, sendo assim: é o renascimento!

Boa sorte.


Ps. Para aqueles que se interessaram pelo livro do historiador Hilário Franco Jr. segue a citação:
FRANCO JR., Hilário. A Dança dos Deuses: Futebol, Sociedade, Cultura. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
É um ótimo livro, tanto para leigos como para historiadores. E como meu amigo afirmou, para alguns “especialistas” que cerram seus olhos apenas para um tipo de leitura, pela atitude do autor, se demonstra que é possível ler outras coisas. Claro, não vou comentar minha opinião formal sobre os motivos da publicação. Seria uma herança “Legoffiana”? Uma coisa é certa, pelo menos é uma boa lembrança, já que não se trata de um livro de História Medieval!

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Um domingo com meu pai

Uma das pessoas que mais me orgulho em ter como amigo é meu pai. Ontem tivemos a oportunidade de estar lado a lado como pai e filho, num hábito bem pai e filho: ir ao Maracanã.
Sabe aquele dia que você se dá conta que deve sair um pouco, ver o dia? Pois é, acho que meu pai pensou assim. E fomos eu, ele, Ana e o grande Thiago Porto ao “templo sagrado do futebol”, futuro palco da final da Copa do Mundo de 2014 (?) – a Suderj sempre informa, mas eu nunca sei!
Bem, conseguir reunir um grande amigo, seu pai e a mulher que você ama para assistir teu time de coração é inigualável, realmente, o é. E foi.
Não tenho muito para falar hoje, na verdade, apenas sussurrei... No fundo, acho que foi o texto do meu chapa Marcelo Fernandes (http://mfpmarcelo.wordpress.com/) que me deu esse fôlego de soltar a voz no dia de hoje!
Estou bem, ando feliz. E voltar para casa com meu pai, só nós dois, no longo congestionamento da Avenida Suburbana ouvindo a Rádio CBN marcou o meu ótimo e tranqüilo fim de semana!
Só poço agradecer a Deus...

Obrigado.

Ps. Estou meio ocupado agora para, junto com minha voz, postar uma foto com meu coroa... então, fica para próxima! Pois ainda terão muitas!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O fim de um ciclo

A voz de hoje vem num tom manso e sem a rouquidão costumeira. Solto a voz já de madrugada, não tão tarde, mas já é quinta-feira e como de hábito, minha voz de hoje, na verdade, fala do passado, um passado recente, é claro, mas que é passado.
No dia 03 de dezembro de 2008 me tornei mestre em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Juro que não imaginava que no ato de minha defesa eu estaria tão calmo, sereno, tranqüilo, o jargão me lembra uma antiga música do Grupo Logos, conjunto musical protestante que fez muito sucesso no seio das Igrejas Evangélicas “tradicionais” nos anos 80 e 90.
Era assim que eu estava. Respondi cada questionamento buscando as nuances da pesquisa, fui elogiado, houve diálogo. Houve o que sempre busquei na minha vida acadêmica uma troca coesa, independentemente se os pressupostos teóricos fossem discordantes da banca. E como a mesma banca afirmou, a pesquisa teoricamente estava bem “amarrada”.
Penso agora num passado mais distante, quase esquecido. Não naturalizarei minha trajetória, pois já quis ser muita coisa na vida: goleiro de futebol, cirurgião, cientista, açougueiro, piloto de avião, arqueólogo (no estilo Indiana Jones), músico, sociólogo e físico. Depois de muito sonhar e ainda sou novo, acabei optando pela carreira de professor, de professor de História e nesse trajeto, com uns meses de curso universitário passei a sonhar em ser pesquisador, mais especificamente, medievalista. O sonho passou a ser o mestrado. Eu tinha que fazer um mestrado.
Ressalto que não quero balbuciar jargões como “sou brasileiro e não desisto nunca...”, pensei em desistir várias e várias vezes, ainda hoje o penso. Mas prossigo, prossigo pois cheguei a feliz conclusão de que, realmente, não sei fazer outra coisa. Que independentemente de salário, status ou coisa assim, é fazendo o que faço que me sinto realizado e hoje ou ontem me senti assim.
Foi bom ver e rever rostos conhecidos. Pessoas com quem contei. Senti falta de outras, que continuo contando para minha felicidade, outras não mais. Foi possível contar nos dedos quem estava lá, o que me remete a uma alegria infinitamente grande. Sei que incontáveis foram as pessoas que estavam naquele momento, em algum momento seu, pensando em mim. Talvez, foram esses pensamentos que me tranqüilizaram e agora que relembro, me surpreendo.
Como disse, não quis falar sobre uma naturalização da minha carreira. Eu seria muito feliz sendo açougueiro. Mas não sou. Mas ainda tenho um pequeno sonho de ter um açougue. E não riam, pois é sério!
Porém, prefiro recortar fontes medievais. Uma alcatra do Poema de Mio Cid. Um contra-filé da Vida de Santo Domingo de Silos.
O garotinho da foto quis ser muita coisa, mas ele confessa que nunca pensou que seria mestre em algo, talvez mestre cuca, mas mestre em História... Jamais!
Fica meu terno agradecimento à minha orientadora, pela confiança antes de tudo e a todos que acreditaram em algum momento, me fazendo, também, acreditar!
E este é apenas o fim de um ciclo...


Ps. Escrevo no calor do momento. Não rolou revisão na voz de hoje, então...